nos armários da oficina seria trágico. O aposento, adaptado da garagem do carro que nunca existiu nem foi dirigido, agora era um estaleiro artesanal.
Eram centenas de projetos, barcos e cascos inacabados, empilhados uns sobre os outros, esperando aquela mão de tinta ou aquele último retoque de verniz para viajar às ávidas mãos de diversos garotos da vizinhança que se encantavam com o artesão e suas criações.
Até mesmo aquele trabalho especial e detalhado do galeão espanhol acabou zarpando para mãos mais jovens, dispostas a por em prática dezenas ou centenas de aventuras que antes aguardavam o meio de fluírem pelo mundo. Netos e sobrinhos, vizinhos e amigos. Crianças de todas as idades, velhas e novas esperançosas pelos barcos do senhor do píer.
Cada pequeno detalhe, cada curva, letra, pincelada e cordame, colocados com a lente de aumento e a pinça de metal não eram simples e meros detalhes, eram sim operações e milagres do divino. Horas investidas na certeza da surpreender olhos brilhantes, os mesmos olhos que gostaríamos de manter com o passar do tempo, quando finalmente os pequenos barcos ficavam prontos.
Em sua casa, algumas peças sobreviventes dos vendavais de “uaus”, “nossas”, e “que lindos” que acompanhados de rápidas mãos varriam de suas posses os belos trabalhos, dividiam espaço com rádios do tempo da válvula, réguas e compassos, mapas e desenhos das mais diversas origens e destinos, numa floresta digna de qualquer avô aventureiro e cheio de histórias para contar. Uma coleção de objetos fantásticos e de idéias sublimes numa vazão de conhecimento e aprendizagem, que apenas uma vida voltada para a própria razão de viver poderia querer manter.
E nessa confusão de caminhos é que se hospedava de tempos em tempos o pequeno neto. Curioso pela história de vida que o avô levara e pela química natural que apenas as gerações distantes poderiam compartilhar. Era esse neto que mantinha o velho avô a procura de determinados e específicos pedaços de matéria naquele local a beira da praia, para terminar a mais importante das suas peças.
O pequeno garoto acompanhou dias, semanas e meses sem fim seu admirável almirante avô, montar parte por parte da singela figura náutica que ali se erguia em um pedestal de mármore, guardado desde a muito em um dos incontáveis armários de seu avô e que seria usado na melhor das embarcações.
sábado, 1 de novembro de 2008
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